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29 de janeiro de 2008

Certidão do Tempo


Em timbre consistente, indubitável:
Eu reconheço o Tempo como legítimo devido ao cumprimento exímio de suas atividades: ele se lembra do ciclo das garotinhas, da menopausa da vovozinha, da careca do baleiro, do menino banguelo, da decomposição da manga que sucumbiu à gravidade.
O Tempo é o funcionário-padrão, a utopia que não contemporiza às cobiças mesquinhas da Humanidade: enriquecer conforme um trabalho à revolução industrial pela visão de Chaplin e torcer a cara para o próprio passado, desfilando um carro recém emplacado.
Os soberbos são os mais medíocres porque desconhecem e/ou ignoram a submissão inquestionável ao tempo. Os soberbos religiosos elegem um horário a devotar a um Deus bonzinho, que mora em uma geografia remota, e fazem-Lhe pequenos cultos semanais que, depois de concluídos, cedem espaço a algumas pretensões psicológicas mais terráqueas e mais modernas. A devoção nunca cessa, por mais que se lhe tente escapar. A devoção tem muitas casas, um patrimônio incalcelável. Está na cobiça, na carência. Na imensa ignorância de não reconhecê-la o tempo todo.

25 de janeiro de 2008


O cérebro é bitolado.
Quando alguém se refere a você –
Cara bem instruído –
Com um português equivocado,
Ah, quanta gargalhada.

MicofRiba.
Vendem-se terninhos de micofriba.
Ao táxi, após a corrida, a cliente, ao taxista:
Obrigada, moço.
E este:
De nado.
Imediatamente,
Gargalhada.

Ao voltar a casa, a moça, à tia:
Adivinha de que eu vim pra cá?
A tia:
De táxi.
A menina:
Não, de nado.

O cérebro é bitolado.

Noradrenalina


Brasília, 25 de janeiro de 2008
Toda época transporta mazelas, haja vista os registros históricos de doenças que disseminaram povos e povos e de guerras que mutilaram gentes e comprometeram o conceito de nação.
O século XXI tem sido a presa das doenças psicológicas e, conforme concluem os patologistas, a maioria das doenças é psicossomática. É o preço de se evoluir e transcender a velha idéia tão defendida pela limitada Ciência, que perscruta e afirma apenas as manifestações palpáveis dessa Terra.
A aparição dessas moléstias cerebrais instiga as pessoas a buscar um sentido extraordinário à vida, a descobrir, quase de forma obrigatória, o Deus.

24 de janeiro de 2008

Toda Idade


Aquela mulher que me passou pelos sentidos há pouco,
O luxo do empresário que porta um Mercedes no trânsito de Brasília,
A armadilha à moda de detetive querendo pegar adúltero,
O fruto podre que sucumbe ao sopro da Gravidade.
Toda idade morre.
Morre-se a cada idade.
Já se nasce para morrer.
O cemitério está crivado de subsistência.
O cemitério sobrevive da decadência da Humanidade.
Toda idade morre ao nosso alcance,
Ou bem distante da nossa imaginação.

21 de janeiro de 2008

Planeta Terra

A Terra é uma criança.
Ou o todo perecível do Mundo, que carrega um pseudo viver inesgotável. Ela gira, gira, gira e ainda faz círculos primorosos com a própria tontura. Rotação. Translação.
A nossa casa é de boneca. Somos regidos por um grande brinquedo - bêbado e aventureiro de nascença. A Terra é uma criança.

18 de janeiro de 2008

Complexo de Cinderela


Depois de ter tido manifestações curiosas – durante a infância – perante as muitas encarnações da Vida, crescido com muitas objeções a vários paradigmas inexoráveis e sucumbido a uma graduação tradicional, a de odontologia, Margarida abriu um comércio de produtos sofisticados para casa e especialmente para toucador.
Exerceu, menos por vocação e mais pela ganância quase natural de que os homens se tornaram reféns com o correr dos tempos, das carecas incipientes e das banguelices dos impúberes, o status de dentista. Enriqueceu. E agora vive para sustentar simples e exclusivamente o prazer. Lida com gente elitizada financeira e intelectualmente. Veste-se bem à beça. Faz tratamentos estéticos. Come em restaurantes que ainda zelam pela privacidade de cada mesa. Namora. Dirige tranqüilamente, em qualquer tipo de itinerário. Aborda a própria vida como se tivesse – cada episódio – um acabamento primoroso. Articula, com delicadeza do tear da aranha, palavra por palavra.
O histórico de Margarida, cada aparição dela – pela manhã, ao entardecer, nos eventos sociais do alto escalão – contemporizaria com sucesso ao extraordinário e, portanto, às mídias. Margarida é uma utopia encarnada. É o personagem ideal para os romances vendáveis.
Ao divã, durante a catarse, diagnostica-se um estado de nervo mantido por tarjas-pretas. Margarida sempre se esforçou com o canteiro exímio da reputação dela, sempre quis um efeito plástico impecável. Impecável é tudo que se desconhece. Se se foi materializado, pecou-se. Viver é a celebração-mor do pecado.

16 de janeiro de 2008

Diluição

O grande mal é quando a dieta dos sentidos sucumbe à insipidez.
Mal-viver.
Desprazer.
Os olhos vêem o óbvio
Os olhos desvêem.

Os sentidos desmaterializados do Amor.
Ah, o Amor.
Os sentidos sem carne do amor também sucumbem à insipidez.
Os ossos desintegram também.
Não é preciso carne para a decomposição,
A caveira do amor dilui no Nada.

Lei da Oferta e da Demanda


Eu não atenderia à demanda daquele amor, daquela volúpia.

2 de janeiro de 2008

Réveillon


Réveillon


Cidade?
Rio de Janeiro!
Atrasaram-se na ceia, vieram convidados extras.
As crianças estavam cansadas à beça, afinal, dormiram sob o calor e a insônia da cidade maravilhosa e acordaram diante dos chamamentos à moda de quartel para irem para a praia.
O tino dos adultos funcionava à base de destilados.
Eunice estava sentindo muita câimbra no corpo. Talvez fosse cardíaca. No entanto, como se não lhe pertencesse o apego imensurável pela existência, prognosticava
: deve ser uma bobagem e se aliviava pensando em todos aqueles camaradas que resistem a tantas overdoses, a tantos excessos.
Tentou estar feliz... Quantas tentativas vãs. Mentalizou bocas promissoras, lascívias promissoras, carnavais de sentidos e transgressões. Cogitou
quanta vanguardaa morte e os olhos se inundaram, mas se contiveram e não cederam às lágrimas.
Observou com filosofia o sentido subliminar dos fogos
.
O repouso é uma alquimia do Cosmo. Depois da vida de carne há uma outra quimera. E ritmou a idéia. Deu-lhe fiéis. Bebeu um pouco do pensamento. Respirou fundo. Acordou. Ilesa. Viva. Agora, sob outra materialização.
O repouso é uma alquimia do Cosmo.