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30 de abril de 2005

Vaidades

Já tive as vaidades típicas de todas as idades que existiam em mim. Agora não tenho mais idade. Estou integralmente entregue às manifestações do Tempo. Não se consegue diagnosticar a quantidade de vida que vive. A quantidade de vida que ainda se tem. Não se pode saber o que é a vida, afinal. A vida são todos esses dedos emendados? A vida são meus ralos cabelos? A vida são os seios que sublinham meu Fado de menina? A vida é esta memória incrível que, com todo seu sadismo, martiriza demasiadamente a (in)consciência do meu dia-a-dia? O que é a vida? O que são todas as circunstâncias? Vaidades são exigüidade de sentido. Vaidade é incumbência de meras matérias vivas. Vaidade é a sedução desenxabida dos acontecimentos que se findam muito rapidamente. A vaidade existe para os que ficam unicamente em beira de praia. Quem arrisca a perder-se no próprio oceano faz, involuntariamente, abstinência de vaidade.

27 de abril de 2005

Natureza Morta

Subitamente me sinto órfã. No ínterim desta minha existência estive, até então, à mercê do tempo, presa a pessoas que contemporizavam às chuvas, aos sóis, aos vendavais que terminavam em exageradas erosões. Agora, como um fruto já maduro que se despenca da acolhedora árvore, estou entregue à minha própria vigília. Como um quadro com cocos solitários, distantes de sua origem. Tudo se torna vassalo desse tempo genérico, unânime... e poucas vidas voltam-se a si. Voltar-se a si é fadar uma solidão árida; é menos perigoso acomodar-se às demandas da vida. Já viemos com a pretensão de outrem em relação a nosso âmago... de manipulá-lo, de encaminhá-lo a itinerários tão cansativos e que, no fim, nos levam ao retorno de tudo e ao recomeço de horas que ousam repetir-se. Horas que se vestem de acordo com a moda dos céus. Horas superficiais... horas estetas. E quando as horas parecem dissonantes em relação aos trajes do tempo, haja saliva! Fala-se... tem-se um balaio de assuntos. E, enquanto os olhos amadurecem em pés entregues ao Firmamento, eu insisto na inércia de ser espectador da própria existência.

23 de abril de 2005

Ponteiros

Vida: Circunstâncias que se incumbem de sê-la. Que pequenez ser em função das pendências que ficaram ontem, que ficarão de hoje para amanhã e que nunca se findarão. Avidez em função de um desvirginar do que estava previsto. Desespero por conta de pouca variedade de belezas, aromas. Vida: A mecânica de conseguir em poucas horas dar conta de tantos e de tudo. E dormir quase que com a necessidade de morrer. O fim das horas e o recomeço da vida são a suma de um indivíduo demasiadamente exausto. A vida sai do seu genuíno sentido para se vulgarizar em meio a números e cores que indicam o que deve ser feito. Não há mais a vida - como conteúdo de embalagem de cada serzinho. Há vida genérica... um esparramar único a que todos devem se acomodar. Devo me acomodar a pegar o trem muito rapidamente, pagar todas as contas, sair correndo de transeuntes conhecidos, voltar ao escritório, tomar água devido a recomendações médicas, adiantar as tarefas de amanhã, ter um quarto de tempo para o almoço, voltar e mergulhar no labor. E de noite me derramar naquela cama e dormir o suficiente para ter boa disposição amanhã. E amanhã, antes mesmo de olhar o tempo, me precaver com sombrinha, óculos escuros... e ir junto a circunstâncias que cismaram tomar papel da minha vida. Da verdadeira pretensão da vida.

Sucesso e Fracasso

Por que se habituou a pôr o fracasso em “néon”? Sempre notas vermelhas em boletim e o sucesso clichê; com um azul “Bic”. Campainhas estridentes aos desclassificados e um apito tênue a quem recebe o primeiro lugar.

21 de abril de 2005

Tempo, tempo, tempo

Enfim o tempo veste-se com o que é poesia para meu corpo inadaptado a sóis hiperbólicos. Sóis como grandes sofredores que choram toda a fonte de lágrima diante de um mísero envelope de casamento em um único dia. Depois resta aridez nordestina para o ínterim dos próximos meses, anos e décadas. Este tempo veio como nota de cem em bolso esquecido... um gozo para um dia que me seria comum, apenas um acordar redundante. Tempo, como lhe agradeço? Através de minha entrega na íntegra a você? Através de uma apologia a você? Como agradeço esse ar que, malgrado transcender minha pretensão, me agrada pra caramba. Agradecer é sempre tão humano, tão pouco, tão exíguo... é a aplicação dos ensaios de semblantes. É descortinar todo o projeto previamente montado. Não lhe agradeço, Tempo. Apenas te vivo... com toda a virgindade do mundo.

19 de abril de 2005

Sem final feliz

ESTE É DEDICADO A UM CARINHA DO CURSINHO.
Semana de mutações ágeis aquela. O sindicato da volúpia resolveu contaminar todo meu cerne. E, desde sempre, minha razão sucumbe à minha própria natureza. Sou um duo na incessante tentativa de não ficar dissonante.
E, fazendo jus ao império da vez (um desejo cujos bastidores desconhecia), criei músculos, transcendi a hesitação e chamei um menino da minha classe para um papo, um beijo ou um contato. Afinal, meu âmago demandava aquela criatura naquele instante. E o rapaz, educado e com um jeito de “década de 30”, o que me agradou demasiadamente, convidou-me para assistir à apresentação da banda dele que se realizaria em um bar alternativo da cidade. Nunca minhas esperanças estiveram tão verdinhas, no ápice a que a Natureza pode chegar.
Já estava às vésperas da materialização de todos os meus sentimentos e uma avidez previsível entrava e saía de cada poro. Na tentativa de um paliativo para o tormento, abro o Tribuna de Minas e vejo a foto do motivo de toda minha perturbação. E, minha pretensão fica imediatamente em ruínas e dá vazão a um emaranhado de sensações que me assaltam. Que me acabam.
Chego a misturar nostalgia com o prazo curto que a Natureza dá à perfeição. O “bonitinho, educado, estilo década de 30” criticou minha indumentária com uma galera da estirpe dele. E riu... riu proporcionalmente às erosões que se fizeram em mim naquele dia. E hoje eu satirizo a tônica dele, que é uma doçura- acessório da vaidade; da tão insípida vaidade humana.

Viva Nelson Rodrigues

Tudo fica ardendo dentro desses nossos incompreensíveis talhes. Quem não é meio delinqüente deixa tudo latente, proliferando e desencadeando câncer... bônus de células. Eu preciso berrar... mas minha acústica é meio insossa. Preciso correr, mas a mata de que gosto me causa pânico. Temo uma onça de natureza obscura. Preciso lhe dizer que ele não é nada pra mim... mas por que fico tentando manter minhas virtudes? Não quero minhas grandes eloqüências em condição de silêncio de hospital; preciso pôr minha voz ao mundo.

15 de abril de 2005

25 horas

Acordar 11 horas da manhã é fadar os sustos nas faces dos normais. Todo o surdo espanto do mundo se concentra no meu fuso-horário diferente. O mundo pára por causa dos anti-convencionais. É como um violino dissonante na imensa orquestra esse meu desrespeito à empáfia das manhãs impregnadas de pendências. Das dez da manhã se espera conclusões e soluções feitas... e desvirgino meu mundo muito mais tarde. Chego simultaneamente a novas safras de novas iguarias da Natureza. Chego junto aos ovos que coincidiram explodir hoje. Chego junto à morte de findáveis criaturas e recentes homens. Chego quando a carga-horária de outros se acaba. Chego realmente abastecida para a fugacidade de um dia em sua íntegra; para a nostalgia e a avidez que estupram toda a lógica do calendário. Não quero transcender horas que nem existem de verdade. Quero contemporizar ao tempo, à leveza de um céu tênue e de uma noite cujo protagonista é um tal de mistério. Mistério que também protagoniza minha linfa, meu espelho, meus tropeços. Mistério que é o mais elevado grau de transcendência a que posso chegar.

12 de abril de 2005

Acessório

Será que esta doçura me pertence e fica grande parte do tempo latente? Porque ela vem com a alma de vez em quando só. Muito de vez em quando mesmo. Como aquele meu cordão em forma de varal que uso raramente. Só em ocasiões que marcam meus futuros que rapidamente caem no pretérito. Meus acessórios, ainda que em inércia, pertencem a esta pessoa. E meus sentimentos: A ira? A nostalgia? A tristeza? A demasiada volúpia? Eles me existem ou, de súbito, surgem assim para assaltar? E a fonte dos céus azuis e negros e rosas e cinzas... é inesgotável? Ou varia de acordo com o temperamento da grande aquarela? E as plantinhas que murcham e ressecam de um dia a outro? Meu Deus, meus deuses... estou indo de submarino em pensamentos que... me existem? Ou são mero acaso?

10 de abril de 2005

Geografia

A Geografia estuda o que já está prontinho... não tem a pretensão de, com a ajuda de um submarino talvez, investigar a aquarela dos bastidores dos céus. Aqui tá clarinho por causa do movimentozinho que a Terra faz e lá, na terra do nunca, tá escurinho. Mas por que o clarinho é dia? Por que é a hora do labor? de as criancinhas irem à escola? Por que a noite é a hora do ilícito? E por que tanta hora? Se, independente da hora, a natureza vai trocando de roupa sem nossa autorização... aos nossos olhos, às vezes, é trágico vê-la tão breve a arrumar-se. Por que, ainda que a Terra gire para justificar as insanidades da natureza, nunca o preto do céu é o mesmo? Ainda que o azul esteja perfeitamente posto no firmamento, ele está desbotado em relação ao azul do meu tempo de criança. E o Sol... por que anda feito um transeunte o tempo todo? E por que a lua, cheinha hoje e esbelta na próxima noite? Geografia, Biologia... enciclopédias são muito exíguas em relação à grandeza e à loucura da Natureza. E eu não tenho vontade de me encher de inteligência enciclopédica. Já tenho anticorpo contra isso.

Extravasar

Tento achar, no meio deste baú cujo cadeado nunca encontro, as doses certas da composição das coisas. Alminhas de crianças com alfabeto incipiente, matéria-prima de cabelos perfeitos e olhos azuis, a pele negra e homogênea. Vasculho tudo que me existe a fim de descascar de vez todo o ininteligível que é tão forte quanto anos em busca de músculos fulgurantes. Onde está toda a aquarela? Há excesso de nuvens brancas no céu, houve superávit de tons pastéis. Tantas rosas rosas e uma grama meio desbotada... talvez o verde esteja em decadência. Quanta viagem. Quanta ignorância... ser humano é ser tão pouco. Acho que este porte é um mísero caminhão... vou aqui e ali, como um pouco, ouço e volto à inércia típica. Mas esse humano é o que aloja minha alminha... e que alminha inquieta esta, que não me dá sossego pleno à noite. Tanto vai e vem no ínterim do dia e, ainda assim, de noite, ela surge atônita capinando meu dia... e enquanto não conclui toda a tarefa, me cutuca feito criancinha ávida em plena madrugada.

9 de abril de 2005

Dia-a-dia

De véspera mergulho a alma em um desejo enorme. Minha alma, às vezes afoga-se em loucuras súbitas. E meu corpo cansa de lutar em nome dessa estranheza toda que é a vida. Portas que cismam em se endurecer, janelas de abertura prática. Vida. Tudo semi-pronto. E tantos sóis, tanto azul, tanta estrela e lua consumindo a nossa indumentária natural... comprometendo a nossa linfa. Quanta erosão... e quanta redundância minha. Que mania eu tenho de ser. Eu deveria me dedicar ao "estar"... mas insisto em ser e isto dá muito trabalho e cansaço.

8 de abril de 2005

Nada está perdido

Estou em uma Era da minha vida em que eu era exageradamente doce. Era mesmo... coisa de cerne, independente de esforços humanos. Doçura era sinônimo de império; do meu império inerente. E o tempo vem,,, céu azul com sol, céu preto com estrelas em exposição para o julgamento dos que ainda têm tempo neste mundo dos "sem hora na agenda". Folhas verdes, flores coloridas, frutas com prazo curto de vida... e, de repente, folhas secas, férias do Sol. E as quatro estações em décadas... minha vida. E a tigela da doçura agora é preenchida por outros transeuntes. A doçura virou um acessório que não mais combina com minhas indumentárias. Raramente saio com aquela alegoria... mas ela está, ainda que à deriva, no fundo do guarda-roupa. De vez em quando a esbanjo a criaturas especiais... mas tudo isso num sigilo digno de carro forte.

5 de abril de 2005

Poesia

Dizem que uma genuína poesia demanda forma, rima, musicalidade, estética exímia. Discordo usando toda minha eloqüência, todos meus músculos humanos e minha eternidade d´alma. Poesia é simplesmente tudo o que me toca. Bach é poeta... a pobreza tatuada diante do céu é poesia, minha sede é poesia, a frustração e o tédio são poesia. Uma vez um amigo me disse que Renato não era poeta; e sim, arquiteto de músicas... e o que são então as boas músicas? Tudo que me toca é poesia. Roupas secando no varal me mostram o tempo reflexivo, se consumindo com uma indiferença a nossa pretensão. O salgado do sal me é poesia... e a inércia de tudo é poesia. A inércia de tudo ganha traquejo com a nossa existência. O verde da árvore é verde porque a gente o reconhece. Ele é simplesmente verde... ele exerce o papel imposto a ele... e ele usa tapões nos olhos. Ele vive simplesmente o que existe nele. E a gente vive também tudo que existe na gente. Mas a gente tem um diferencial... o de poder desbotar as interrogações acerca dessa parafernália enigmática que invade as nossas vistas, os nossos ouvidos... Poesia é tudo que me toca. O piano em movimento me é poesia... a beleza absorta. Os prazeres são o Camões dos corpos.

3 de abril de 2005

Intra

Bem sei que ver as coisas, apalpá-las, cheirá-las, comê-las, ouvi-las culminam pensamentosinhos. Profundérrimos ou miseramente pensamentos na inércia de dicionário. Não importa. A questão é vida e cerne... todo esse humano em harmonia ou dissonância com as revoluções intrínsecas. Se está agudo em mim todo o amor mal resolvido ou a volúpia atiçada pela minha própria fraqueza humana é porque houve um motivo inicial. O porquê é até óbvio. Mas a fonte, o embrião me é obscuro. A interrogação desbota... não há vias para transcendê-la. Sei que isto é em função daquilo... assim como a quantidade de melanina em mim tem a ver com meu vovô que já se transformou em pó. Mas, por quê? Por que a natureza tenta ser redundante?... como ondas que nunca são idênticas, mas tentam vir com o mesmo traçado delineado?

Vidinhas Previsíveis

Quando as trilhas começam a ficar previsíveis, vem a mim uma sensação horrorosa de ojeriza a tudo. São cordinhas em pescoços que nem mereciam realce (haja vista a crueldade vinda da natureza ao talhar certas partes do corpo dos mortais), são perfumes que despertam o paladar, a audição, a visão e culminam, quase sempre, numa decepção tremenda. Propagandas enganosas para nós mesmos. Produção que demanda inércia total, porque qualquer movimento humano é capaz de pôr em ruínas o efeito de um botox. Penteados contidos, controlados pela aspirina inerente da gente. A nossa própria sudorese infringe a pretensão humana dos fios. Os fios, míseros fios, vencem a nossa geografia inteira. E cutucam a nossa alminha. Causam cólera e vontade de fuga.

2 de abril de 2005

Nitidez

Às vezes acho até bom os pensamentos não serem nítidos, serem isentos de um aspecto. Serem; apenas isso. Se pensamentos crescessem fisicamente já nem seríamos visíveis. Estaríamos envolvidos por arbustos humanos... como um câncer não remediado. Que bom que meu ódio não precisa de cômodo para se instalar, que minha alegria não demanda luxos e preços altos. Essas células que se revolucionam em mim deixam frestas
à alma... ao (in)consciente. Minha consciência é um vigia que transcende as horas humanas... tem sempre uma cadeira para sentar-se e controlar todo meu instinto. Tudo sem medidas e tão certo, tão exato. Uma exatidão que infringe toda matemática humana. Que me livrem de um dia dar corpo a tudo que existe em mim. Seria a inauguração da espantosa existência de monstros e sereias...

Poesia

Somos redemoinhos súbitos. Assaltos. Acordo com a elevação acústica dos vizinhos... e meus ouvidos agora são meu império. Maritacas com fuso horário diferente do meu também costumam me despertar. O coração, antes de mim, anuncia algo por que eu não estava esperando. Enfim, acordo de corpo inteiro... e como um início de carga-horária vão se acendendo em mim as mãos, o olfato, a audição, o tato, o paladar, a visão. E cada hora um desses é minha trilha. Se um carro passa com graúdos lá dentro, percebo vidinhas ainda recentes, ou então já impregnadas de erosões das horas. De longe colisões de gente e de coisas... meus ouvidos são mestres, percebem a dissonância do piano na hora de traduzir às teclas todo logaritmo de Bach. Minhas mãos vão antes de mim... sempre! Elas preparam aquele banho... dosam direitinho a minha afinidade com a água e fadam horas de tranqüilidade. Sou partes de mim. Nunca sou na íntegra. Sou redemoinhos que me são. E, de repente, preciso sair... porque meus ouvidos me alertam algo.

1 de abril de 2005

Sempre Devaneios

Em plena segunda-feira o Fado inicia o processo de preparação do âmago. E uma das minhas prediletas do Bach vem lá de longe,incessantemente. Como uma passeata que se aproxima, se aproxima e me seduz a ir vê-la com lentes de aumento. A música delineada outrora agora é a orquestra na beira da minha janela. Chegou o sábado... redundantemente cheio de promessas, fés, politeísmo. Sábado é o "tudo vai dar certo" é a alforria da semana controlada por aspirina, é o total descompromisso. Porque dia-a-dia o corpo ainda vai lá e faz. Faz, faz e nunca acontece, porque não há desejo verdadeiro. Há apenas um respeito às convenções. Embora lá no fuuuuuuuuundo eu seja uma irremediável infratora.