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23 de novembro de 2006

Caridade

Finalmente, tenho restos e sobras de tempo. Estou corroída pela própria condição a que o Tempo me submeteu. O dia foi um gerúndio com letras ininteligíveis de um recente aprendiz da linguagem escrita. Confusão. Muita demanda a uma essência inábil a mil e uma burocracias vãs.
O bicho civilizado andou a passos velozes pelo dia todo. Correu feito répteis assustados perante o colosso de um bicho-gente. O meu colosso são os prédios imensuráveis do centro da cidade, as falações que assassinam meu ouvido defeituoso, sapatos altos exalando maus hábitos, sóis dissonantes com a fome da minha cegueira.
As pernas se desgastaram a uma proporção que equivale a dez anos de uma máquina comprada com garantia de troca (em caso de surgimento de desgastes precipitados). Envelheci muito do que a Fatalidade tinha para me envelhecer. Num ato presunçoso e dessabido, ignorei a Natureza.
Nem a rixa inerente ao existir foi respeitada. A consciência, brigando com o frenesi da inconsciência, culminou em desrespeito a ambas. O ritmo continuou, a tentativa de calmaria foi vã e arrisquei-me nos parâmetros da indiferença. Enganei-me. Equívocos acontecem. O organismo, em sua homogeneidade, peregrina – com seus pés possantes – por toda a agonia de quem tenta abdicar-se da própria vida e não consegue. O organismo é um vestibulando despreparado para a potência que se imagina da Morte.
Meus devaneios já estão inaugurando um manicômio próspero de grandes existências intraduzíveis. Espécies inimagináveis pelos grandes sábios cientistas lançam-se a mim; num, ainda que involuntário, gesto de carinho ao Homem, acolho cada novidade viva.

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