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20 de março de 2005

Espelhos

Decido intempestivamente sair de carro com Mariana para desvirginar a clausura. E, à medida que o carro, comandado por uma mão versátil, infringe o ar, encontro espelhos por todo lado. Vejo flores púberes, senhoras árvores, vidas que já perderam grandes partes e agora sintetizam novas safras de vidas. E olho para o céu que é apenas a vitrine de uma prévia montagem ininteligível a nós humanos. E então pego meu baldinho, fico na beiradinha das minhas idas, depois um naviozinho se faz necessário e vou, como uma transeunte de mim mesma, pela minha linfa e, finalmente, encaro um submarino. Vou até minhas entranhas já empoeiradas. Pouco lembradas. E fico imaginando toda a ação do tempo. Não há descanso. De domingo a domingo, de hora em hora e do tempo que extravasa os limites inventados pelo homem, o tempo incessantemente muda, faz nascer, tira. São menarcas, menopausas, gravidez, descobertas, cabelos brancos, primeiro passo, primeiro beijo. Folhas secas, sóis, estrelas chegando sem pedir licença, montanhas aproveitando a fresta que a noite lhes deixa para aproveitar no sigilo tudo a que têm direito. Letras depois de letras, escalas diferentes no piano, pano da mesa caindo, telefone chamando e o tempo vai correndo sempre na frente, como se uma criança nos desobedecesse na calçada perigosa.

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